Imunidade e Microbiota Intestinal
- SAIBA+
- 2 de jan. de 2020
- 3 min de leitura
Atualizado: 6 de jan. de 2020
Estamos acostumados com a ideia de que o trato gastrointestinal é o local de digestão e absorção dos alimentos, mas há várias décadas os imunologistas mostraram que a mucosa do intestino aloja a maior coleção de células imunes do corpo e que estas estão em atividade contínua, intensa e silenciosa. A mucosa intestinal humana tem uma área total de 300 m² dobrados em vilosidades e microvilosidades e que essa vasta superfície de contato do corpo com o meio externo é constantemente banhada por uma camada de muco contendo componentes da dieta e da microbiota.
A microbiota intestinal é um conjunto de microrganismos que existem no intestino humano. Estima-se que essa contém 100 trilhões de bactérias comensais de 1200 espécies diferentes com uma atividade metabólica equivalente àquela do fígado e o peso de um verdadeiro órgão do corpo: 1 quilo e meio. Esses microrganismos estabelecem com o hospedeiro uma relação de mutualismo, em que ambos contribuem e se beneficiam. A microbiota intestinal caracteriza-se pelo seu constante dinamismo, sendo que este pode ser afetado por inúmeros fatores ambientais como dieta, estilo de vida, consumo de antibióticos e idade. A combinação de células e genes bacterianos com células e genes do hospedeiro leva à concepção de um “superorganismo”. Este depende das interações apropriadas entre o microbiota intestinal e o hospedeiro para alcançar e manter a saúde. A descoberta, nas últimas décadas, de que a microbiota intestinal e os componentes dietéticos exercem funções até então insuspeitas no sistema imune trouxe várias informações importantes sobre as doenças humanas e sobre novas alternativas terapêuticas baseadas na manipulação desses componentes.
O desenvolvimento adequado do GALT (isto é, do tecido linfoide associado à mucosa intestinal) são de extrema importância para o funcionamento normal do nosso sistema imune, permitindo uma menor suscetibilidade a patologias. Vários estudos mostram que a microbiota se estabelece muito cedo na vida e que a sua composição é influenciada por fatores como o tipo de parto, o aleitamento, a alimentação, assim como o uso de antibióticos e conservantes alimentares. Perturbações na diversidade dessa microbiota (disbiose) desencadeada por esses fatores externos têm sido relacionadas ao desenvolvimento de doenças diversas como alergias, doenças autoimunes e inflamatórias crônicas, obesidade e distúrbios neurológicos graves.
Em seu contexto normal, as bactérias comensais que habitam o intestino exercem funções na digestão de alimentos como fibras produzindo ácidos graxos de cadeia curta que, por sua vez, têm ação anti-inflamatória, na produção de nutrientes essenciais como vitamina K e na proteção contra a invasão da mucosa por agentes infecciosos. As bactérias também são importantes na competição por espaço e nutrientes com bactérias patogênicas e inibem diretamente vias de sinalização pró-inflamatórias estimuladas por patógenos e que são necessárias para invasão, controlando infecções ou impedindo que essas se instalem.
Vários trabalhos têm mostrado a disbiose pode ser corrigida e a composição da microbiota restaurada através da introdução de bactérias probióticas capazes de devolver o equilíbrio homeostático das funções imunológicas do intestino e até de exercer atividades anti-inflamatórias em várias doenças tais como alergias e doenças inflamatórias crônicas do intestino. Esses probióticos têm sido crescentemente utilizados na clínica com sucesso. Se ocorrer uma alteração extensa da microbiota, poderá ser necessário recorrer a um transplante fecal para restabelecer ou modificar a microbiota intestinal, minimizando os danos causados.
Referências
1. O intestino e o sistema imune. Sociedade Brasileira de Imunologia. Disponível em: https://sbi.org.br/2019/04/29/o-intestino-e-o-sistema-imune/.
2. GONÇALVES, PAM. Microbiota–implicações na imunidade e no metabolismo. 2014, 53 f. 2017. Tese de Doutorado. Dissertação (Mestrado em Ciências farmacêuticas), Universidade Fernando Pessoa, Porto.

Letícia de Oliveira Santos.
Acadêmica do 4º período de Medicina da Faculdade Ciências Médicas de Minas Gerais.
Texto excelente, parabéns!